Um novo marxismo contra a barbárie

16 de novembro de 2005 Um novo marxismo contra a barbárie

Se Marx ressuscitasse em nossos dias, rapidamente enlouqueceria. A avaliação é do filósofo Leandro Konder, professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro e uma das maiores referências no estudo e na divulgação do marxismo no Brasil. ‘‘Marx é um homem do século XIX. Hoje, nós temos problemas aos quais o Marx não traz nenhuma contribuição de peso’’, afirma. Para Konder, é preciso assumir algumas ‘‘contaminações’’ teóricas que afetaram o marxismo ao longo do século XX como forma de potencializar as idéias do pensador alemão diante dos impasses colocados pela contemporaneidade.

‘‘Como Marx poderia pensar uma crise política que se desenvolvesse a partir da crise dos partidos políticos? O partido político é uma novidade. Somente no final do século XIX é que nascem os partidos políticos modernos, de massa’’, exemplifica. Mais que um pensador que soube assumir corajosamente sua opção política, o que lhe valeu o exílio na Alemanha nos anos 70, Konder é um filósofo que é resultado de suas convicções socialistas – herança do pai, o médico e líder comunista Valério Konder, com quem Leandro, ainda na infância, teve os primeiros contatos com os ideais marxistas.

‘‘Eu encontrei Marx antes mesmo de ler Marx. Porque ele estava muito presente na minha casa através da trajetória de meu pai’’, Leandro conta por telefone. A dificuldade na fala, decorrente do mal de Parkinson, não impediu o filósofo de conversar com O POVO por mais de uma hora nem de defender com muita clareza e firmeza sua crença na capacidade do homem em resistir ao que chama de vitória do capitalismo. ‘‘O capitalismo venceu. Mas não sei até quando ele vai poder sustentar essa vitória’’, avisa.

O POVO – Como nasce seu interesse pela filosofia? Como o senhor de descobre filósofo?

Konder – Eu me lembro de me interessar muito por um tema estranho quando era criança, que era o tema da morte. Então, se interessar pela morte já é um sintoma estranho que mostra uma inclinação filosófica muito peculiar. Eu me lembro de conversar muito com meu pai sobre isso. Meu pai não se interessava muito sobre esse tema. Ele era um velho comuna e me dizia: ‘‘por que esse negócio de morte? E a vida? Por que não falar sobre a vida?’. E eu disse: ‘‘Eu sei, mas uma coisa não bloqueia a outra, uma coisa remete à outra’’. Então, esse foi um dos momentos que me marcou. Quando entrei na faculdade de Direito, entrei para ser advogado criminalista. Com seis meses na faculdade, percebi que tinha feito besteira. Aí passei a me perguntar: ‘‘o que é que vou fazer? Filosofia’’. Mas encontrei Wanderlei Guilherme dos Santos e disse que ia fazer filosofia. Ele disse: ‘‘não faça isso, não faça isso. Não há uma formação sistemática de filosofia no Brasil. Seja um filósofo autodidata, um filósofo amadorista’’. Achei engraçada a recomendação e não fiz realmente o curso de filosofia. Mas também não abandonei completamente a idéia, fiquei com ela na cabeça.

OP – Essa inquietação inicial em direção à filosofia levou o senhor a que tipo de leitura?

Konder – Quando garoto, eu lia muito Monteiro Lobato, Alexandre Dummas, Os Três Mosqueteiros; e fui lendo. Na faculdade de Direito, eu lia muita coisa, lia tudo, menos Direito. Atualmente, ando lendo um quadro de autores mais amplo e mais diversificado do que no passado. No passado, eu li muito Marx. De 1972 até 1978, eu vivi na Alemanha. E lá ganhei de presente de um sindicalista brasileiro uma coleção das obras completas de Marx. Quarenta e tantos volumes. Eu li tudo aquilo ali. Então, minha leitura não era só do Marx filosófico, mas do Marx político, do crítico da economia, do teórico da história. Mas minha formação intelectual foi mais individual, mais ligada a pessoas que passaram a ser referências para mim. Nesse sentido, eu conversava tanto com professores conservadores, como Aliomar Baleeiro, Afonso Arinos de Mello Franco, Pereira Lira, quanto com gente mais da esquerda, como o Joaquim Pimenta. Mais tarde, fui aluno do Iseb, onde conheci gente como o Álvaro Vieira Pinto, o Nelson Werneck Sodré e o Roland Corbisier.

OP – O senhor é hoje nosso principal teórico marxista. Como se deu o seu encontro intelectual com Marx?

Konder – Acho que encontrei Marx antes mesmo de ler Marx. Porque ele estava muito presente na minha casa através da trajetória do meu pai. Meu pai era um velho comunista e uma pessoa muito apaixonada. Eu observava meu pai e seus amigos e achava que eram todos meio louquinhos. Aquela religiosidade deles me deixava muito intrigado. Mas uma coisa eu sabia. Eu achava o fato deles serem perseguidos profundamente injusto. E pensava: ‘‘Eles são meio doidos mas são gente do bem, são pessoas boas’’. Então, ficava tentando entender melhor essa religião. E a religião deles era o marxismo. Comecei a fazer perguntas e fui lendo Marx. Aquilo foi me marcando. Claro que a leitura do Marx também foi mudando ao longo da vida. Mas os textos do Marx que mais me marcaram até hoje foram os Manuscritos Econômicos e Filosóficos, de 1844; e as Teses sobre Feuerbach.

OP – De que maneira o Marx pautou sua postura como filósofo?

Konder – Marx foi o maior pensador dos últimos três séculos. Isso é inegável. Nesse sentido, ele foi sempre meu principal interlocutor. Uma das coisas que me marca em particular é a concepção que ele tem do homem. Para Marx, nós somos sujeitos da praxis. O homem existe transformando o mundo e se transformando, se reinventando. Em sua concepção da história, o homem sofre o condicionamento material, mas também intervem, projeta, interfere, tenta alcançar seus objetivos.

OP – Em entrevista recente à revista Cult, o senhor afirmou que se Marx ressuscitasse hoje, ele se suicidaria, tamanho o grau de desenvolvimento do capitalismo em nossos dias. Eu queria que o senhor comentasse essa afirmação. O mundo fugiu do controle das ‘‘formulações marxistas’’? Que respostas o marxismo pode nos dar à realidade colocada hoje?

Konder – É preciso dizer que Marx, sozinho, não me é suficiente. É preciso ter outras referências, outras matrizes teóricas. O marxismo não é uma grande receita, com idéias práticas e aplicáveis. Ele tem um caráter mais abstrato. Como ciência social, ele frequentemente se torna um dogma, o que lhe torna meio esquemático. Isso é um equívoco. Mais do que um instrumento que é aplicado pura e simplesmente, Marx nos dá um fermento para compreender a realidade. Por outro lado, mesmo os pensadores mais geniais, mesmo os teóricos mais fantásticos, eles pensaram com o material disponível no tempo deles. O Marx pensou com o material disponível no tempo dele. E acertou muita coisa, mas também errou algumas coisas. Então, se o Marx ressuscitasse ele não chegaria a se suicidar porque ele enlouqueceria antes. Enlouqueceria rapidamente. Porque, veja bem, ele não ia entender o computador, no tempo dele não tinha cinema, não tinha rádio, não tinha aviação. Ele é um homem do século XIX. Hoje, nós temos problemas aos quais o Marx não traz nenhuma contribuição de peso.

OP – Que tipo de problemas?

Konder – O Marx está vendo coisas, mas as coisas que ele está vendo são do século XIX. Politicamente, por exemplo, não havia partidos políticos no tempo dele. Então, como ele poderia pensar uma crise política que se desenvolvesse a partir da crise dos partidos políticos? O partido político é uma novidade. Somente no final do século XIX é que nascem os partidos políticos modernos, de massa. Os sindicatos de massa também só no século XX, na virada do século XIX para o século XX. Marx não viu isso e nem poderia ver. Nós não podemos cobrar dele o que ele não viu. Não podemos tirar café da vaca. Eu costumo dizer que a designação marxismo talvez nem seja a melhor. Eu me considero marxista como forma de simplificar, de expor minha identidade. Mas nem tudo o que Marx diz pode ser considerado marxista porque se trata de uma concepção de mundo muito fragmentada internamente.

OP – Nos anos 70, o senhor foi preso e teve que se exilar na Alemanha. De que maneira essa experiência do exílio marcou sua formação como filósofo? E de que maneira ela modificou a maneira como o senhor passou a ver o Brasil?

Konder – Eu penso muito sobre isso. Em geral, concluo o seguinte: essa experiência me marcou no sentido de que passei a ter um quadro de referências muito mais amplo, muito mais vasto porque coisas que não sabia que existiam eu não podia levar em conta. Mas depois que fui para o exílio, depois que descobri essas coisas, tinha que levá-las em consideração, concordando ou discordando. Às vezes, eu concordava, às vezes discordava. Por exemplo, a crise do marxismo. Eu me considero ainda hoje marxista. Mas um marxista sobrevivente. Naquele tempo eu achava que para sobreviver tinha que preservar o marxismo de uma série de contaminações teóricas que achava profundamente lamentáveis. Aprendi a respeitar essas contaminações e a desconfiar que talvez elas sejam inevitáveis. A gente tem que participar de um processo de assimilação e de gestão dessas idéias fora do marxismo. Temos que ajudar a recriar uma vitalidade em termos de determinados conceitos do marxismo.

OP – Que conceitos devem ser revitalizados ou reformulados nesse sentido?

Konder – A teoria da luta de classes, por exemplo. Para Marx, ela era verdadeira. No século XX passou a não ser muito verdadeira e desconfio que no futuro ela vai voltar a ser verdadeira. A produção industrial não está anulada, não está cancelada. Os trabalhadores, as pessoas que produzem, que trabalham, elas vivem hoje uma variedade muito grande de condições. Há uma diversidade de trabalhos que faz dos trabalhadores uma classe muito mais cheia de diferença internas do que o Marx achava. A gente olha e nossa situação é outra. A classe operária abrange desde o trabalhador braçal, o carregador do cais do porto, até o intelectual universitário que está o tempo todo com o seu computador. Isso não havia no tempo do Marx.

OP – Como marxista, o senhor tem um interesse mais específico por estética e pela história do que propriamente pela filosofia política. Qual o principal legado marxista do ponto de vista da estética?

Konder – O marxismo, e isso é um fenômeno curioso, é um conjunto muito mais cheio de diversidade do que a gente pode imaginar. Achei que essa seria outra das razões pelas quais acredito que o ve-lho Marx, se ressuscitasse, enlouqueceria. Ele diria: ‘‘poxa, fulano é marxista e beltrano também. Mas eles pensam tão diferentes (risos). Eu nunca pensei em ser tão mal interpretado’’. Porque a única maneira de você conceber o marxismo ou reunir uma corrente que reúne gente tão diferente é você imaginar que essa corrente não pode se uniformizar justamente porque ela é diversificada internamente. É muito diversificada. E isso é bom, se a gente aprender a conviver com isso.

OP – Hoje, uma vertente significativa da literatura e das artes plásticas, em especial, tem se preocupado muito mais com seus próprios códigos, com a investigação de sua própria linguagem, do que se engajar efetivamente nas questões de nosso tempo. A arte está esgotando sua capacidade de dar respostas às demandas de nossos dias?

Konder – A própria crise da ação histórica corresponde a uma crise do conhecimento. Se eu não estou conseguindo fazer a história, a história está me escapando, está se erguendo diante de mim, de uma maneira meio assustadora, meio estranha e ameaçadora. Esse estranhamento é o estranhamento da alienação. É um fenômeno que o Marx estudou bem. Na medida em que isso ocorre, as áreas do conhecimento também refletem isso. E entre essas áreas do conhecimento está a arte, que também é um conhecimento, um conhecimento especial que não se deixa reduzir nas formas da ciência mas é um conhecimento. O homem se conhece através da arte. O homem se conhece fazendo arte, se conhece convivendo com a arte, entendendo a linguagem da arte. Então, é normal que a arte de repente diga: ‘‘bom, no meio dessa crise eu quero declarar que não sei como resolver os problemas dos vizinhos, mas os meus eu tenho uma proposta para resolver’’. E aí começa essa discussão que você coloca. Aí entra o velho Lucáks em cena. O Lucáks, esteticamente, é meio conservador, mas acho que ele faz um trabalho sério, um trabalho que ajuda a gente a discutir, a pensar. Eu sei que nós estamos fazendo a verdade. Ela não se faz por si mesma sozinha. Então, a gente tem que pensar na arte, na discussão sobre a arte como uma parte desse quadro. A arte não é, evidentemente, a maneira de você fazer a revolução. Mas existe também a arte que ajuda a te contar, a compreender o mundo, a compreender você mesmo. Essa arte é preciosa.

OP – Esse ano é comemorado o centenário de Sartre, que foi um modelo de engajamento político por parte dos intelectuais. O senhor entende que há uma certa reclusão por parte dos intelectuais no sentido de dialogar com as questões políticas de nosso tempo?

Konder – Acho que houve um movimento coletivo. Muita gente não topou se afastar mas muita gente se sentiu melhor se afastando da briga política. Existencialmente eu compreendo. Agora, quando penso a história como um movimento que nós estamos fazendo, aí começo a lamentar que pares meus tenham se afastado da tentativa de fazer história. Isso eu acho ruim. Acho que a essência da democracia não é só a luta pela igualdade ou a luta contra a desigualdade. A essência da democracia também é uma luta pela mobilização ampliada. Você precisa ter a adesão de gente que vem de fora, trazendo outro tipo de pensamento que não é igual ao seu e essa diversidade, essa diferença, é que vai te permitir superar uma certa estreiteza, uma certa insuficiência de análise que a gente sente que estamos tendo hoje.

OP – O senhor foi filiado ao PT, mas se desligou do partido na época da expulsão de Heloísa Helena e dos demais ‘‘radicais’’. O que aconteceu? O PT deixou de ser um instrumento de transformação social?

Konder – O PT é um instrumento de transformação social mas impregnado de oportunismo, malandragens burguesas. Então, deixou de ser aquele partido no qual eu ingressei.

OP – Que tipo de malandragem burguesa?

Konder – Acordos sem princípio, alianças feitas por conta de vantagens momentâneas, vantagens materiais. Para você fazer política, você tem que estar preparado para o conflito e também para a negociação, isso é inevitável. Então, se você negocia sem princípio, se você negocia sem ter uma análise da composição social da estrutura na qual você está atuando, você não está contribuindo para mudar coisa nenhuma. Você está contribuindo para eternizar aquela estrutura que você está dizendo que combate. É uma alienação. Se você participa dela, você contribui para que ela se renove e se aprofunde, se agrave. Acho que o PT foi uma grande esperança, eu cheguei a escrever entusiasmado sobre o PT como o partido da nova esquerda pós-leni-nista. Mas o PT não é pós-leninista coisa nenhuma. O PT não é nada. A proposta que o PT anuncia é de uma mudança lenta e gradual. Enquanto isso, vai se fazendo novos negócios, novas negociatas.

OP – Ao sair do PT, o senhor se filiou ao PSOL, que não é um partido que tenha a mesma trajetória do PT nem o mesmo tecido social do PT. O que pode o PSOL nesse sentido de se afirmar como um instrumento de transformação social para o País?

Konder – Quando entrei para o PT, fascinado pela presença maciça de trabalhadores de áreas populares, aquilo me levou a descuidar de um ponto importante. Você só faz mudança revolucionária com muita teoria e essa teoria estava faltando ao PT. Hoje, não há nenhum teórico sério trabalhando em função das necessidades do PT. Eu sinto que no PSOL você tem o risco oposto. Uma abstratividade muito grande no plano cultural, no trabalho teórico. O PT começou a descuidar do investimento na teoria, no estudo. Sinto que há um clima favorável à correção dessa fa-lha na militância do PSOL.

OP – Nessa mesma entrevista à revista Cult a que me referi anteriormente, o senhor afirmou que ‘‘resistir’’ é uma forma de ação política do socialismo diante do mundo globalizado e do modelo neoliberal. A que mecanismos de resistência o senhor se refere?

Konder – À própria disponibilidade que a gente tem no sentido de não aceitar resignadamente o que é estabelecido pelos de cima. Essa resistência à imposição das palavras de ordem, das normas definidas pelos que estão em cima. E essa resistência reside no cotidiano, reside sobretudo nas iniciativas políticas, na participação da vida sindical, são manifestações de oposição ao que está aí. Você não pode é se descuidar e deixar que, por omissão, por silêncio, você seja visto como um homem identificado com esse sistema que aí está. Esse sistema é perverso. Sartre dizia que a gente tem razão para se revoltar. O capitalismo venceu. Mas não sei até quando ele vai poder sustentar essa vitória. Há contradições muito grandes. Nós temos que exercer uma crítica matizada nesse sentido, porque a gente vai trabalhar com o capitalismo nas próximas décadas, vamos trabalhar com o mercado. Não há como não trabalhar com ele. Nós temos é que negociar limites para a ação do mercado, senão ele destrói todos os valores qualitativos. No lugar desses valores, vai surgir outro, quantitativo, que é o preço. Antigamente, você tinha valores humanos como a dignidade, a honestidade e a sinceridade, que eram qualitativamente absolutos. Hoje a honestidade está sendo negociada. Mas os que patrocinam esse sistema que está aí, que patrocinam essa ideologia dominante, sabem que não conseguem prever tudo. Sabem que não conseguem ter antídotos contra crises, a não ser contra as que já aconteceram, aí eles sabem direitinho como dominar a crise, como superar a crise. Mas as crises novas são imprevisíveis, as crises novas são surpreendentes. Nós temos que, de certa forma, também apostar na nossa capacidade de participar das crises aprofundando as contradições do lado de lá, questionando o poder constituído. E aí tenho certeza que vão acontecer situações nas quais nós, socialistas, vamos voltar a ter peso e vamos poder reapresentar e reelaborar um programa de inspiração socialista, corrigindo os erros que cometemos no passado.

OP – Uma palavra que passou a aparecer com alguma força no discurso da esquerda é a palavra ‘‘barbárie’’, no sentido de um desdobramento ‘‘natural’’ do modelo neoliberal. Como o senhor compreende uma expressão como essa?

Konder – Quando a gente diz que nós fomos derrotados e que eles venceram, nessa vitória deles está contida já a idéia da barbárie. É uma barbárie mo-dernizada, sofisticada, com alta tecnologia, mas é barbárie. A Rosa Luxemburgo já entendia isso. A Rosa Luxemburgo, combatendo o determinismo de alguns marxistas, dizia que na história há um dilema. Ou nós vamos ao socialismo, se nós vencermos; ou nós vamos à barbárie, se eles vencerem. Eles vence-ram e nós estamos na barbárie. Penso nisso quando vejo notícias sobre o que aconteceu nos Estados Unidos, que tem o padrão mais elevado da civilização e da cultura do capitalismo. O que aconteceu em Nova Orleans, que ficou coberta de lama? As pessoas foram solidárias? Generosas? Se trataram com todo o respeito? Nada disso. Foi um espetáculo grotesco. Uns pisando na carótida dos outros. No Brasil, nós temos hoje a violência como uma grave questão. Mas ela cresce justamente em função da selvageria do mercado capitalista no Brasil. As pessoas chegam a se escandalizar com a violência, mas ela não pode ser só combatida pelo discurso ético. Só a prática, só as medidas que diminuam as desigualdades sociais, poderão combater o problema da violência.

OP – E no campo da cultura, como essa barbárie se manifesta?

Konder – É um festival da imensa vitória do mercado, da indústria cultural voltada ao mercado, que é aceita hoje como norma. Hoje em dia ninguém acredita que pode fazer uma alternativa se não houver condições de mercado favorável. Muitas vezes, até o alternativo está dependendo do mercado. Isso quer dizer que a cultura esqueceu o mundo.

OP – Que modelo de sociedade o senhor definiria como a sua utopia?

Konder – Minha utopia continua sendo o socialismo, mas um socialismo sério, capaz de ser coerente, capaz de ser brigador, capaz de ser construtivo, capaz de ser democrático, de se abrir ao aumento da parti-cipação das massas. É preciso abrir espaço para que as massas participando mais, participem melhor.

Wanderlei Guilherme dos Santos – cientista político, escritor e membro do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj).

Aliomar Baleeiro (1905-1978) – jurista, professor universitário e ex-ministro do Supremo Tribunal Federal.

Afonso Arinos de Mello Franco (1905-1990) – diplomata, parlamentar e professor universitário.

Pereira Lima (1899-1985) – professor universitário, deputado federal, chefe de polícia do Rio de Janeiro e ministro do Tribunal de Contas da União.

Nelson Werneck Sodré (1911-1999) – filósofo e historiador, autor de Formação Histórica do Brasil e História da Burguesia Brasileira.

Roland Corbisier (1914-2005) – escritor e filósofo, autor de Formação e problemas da cultura brasileira e A responsabilidade das elites.

Ludwig Feuerbach (1804-1872) – filósofo hegeliano cujo materialismo teórico Marx vai analisar e contrapor em seu livro de 1845.

Manuscritos Econômicos e Filosóficos – nesse livro, Marx lança a idéia de alienação do homem resultante da condição de desigualdade imposta pelo modo de produção capitalista. Escritos em 1844, os textos só foram publicados em 1932.

György Lucáks (1885-1971) – filósofo e político húngaro de origem judaica

Rosa Luxemburgo (1871-1919) – pensadora e revolucionária socialista, fundadora do Partido Comunista Alemão.

Jean Paul Sartre (1905-1980) – romancista e filósofo existencialista francês.

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